DOSSIÊ CÂNCER:
A PREVENÇÃO, A LUTA, A VITÓRIA
Houve um dia em que ter diabetes era uma sentença de morte - ou pelo menos de alguns membros amputados. A pressão alta, a garantia de um ataque cardíaco iminente. Ser portador de HIV, uma verdadeira arma apontada para a cabeça. Hoje, são doenças ainda graves, mas crônicas e controláveis - qualquer um pode conviver com elas e ter qualidade de vida, desde que tomados alguns cuidados.
A epidemia assustadora dos nossos tempos de vida longa e farta (inclusive de maus hábitos como fumar, beber, comer demais e não se exercitar) é o câncer e suas mais de 100 variações já identificadas. Um assunto que interessa a todos nas próximas postagens, que compreenderão um DOSSIÊ CÂNCER: A PREVENÇÃO, A LUTA, A VITÓRIA. Você lerá e verá que ter câncer não é uma loteria, mas sim uma probabilidade estatística. Esse diagnóstico vai aparecer para metade de nós nos próximos anos.
A cura definitiva da doença em qualquer estágio já foi cravada algumas vezes, e tema de notícias ou assuntos publicados neste blog. Hoje, cientistas de todo o mundo parecem convergir para uma solução menos milagrosa que um elixir mágico, e, por isso, mais plausível: manter o câncer sob controle. As últimas descobertas aplacam a fúria da multiplicação das células cancerosas e garantem uns bons anos a mais de vida, e o principal: com qualidade. Para que o câncer, muito em breve, seja a nova diabetes, metaforicamente, só nos impeça de comer alguns doces, mas não de viver.
TRATAMENTOS:
BATALHA SEM FIM - UM INIMIGO MUTANTE REQUER UMA LUTA EM VÁRIAS FRENTES. OS TRATAMENTOS MODERNOS CONTRA O CÂNCER TÊM POR OBJETIVO DOMAR COM A QUAL PRECISAREMOS CONVIVER
TRATAMENTOS: MEDICINA TRADICIONAL
PARA ALÉM DOS TRATAMENTOS TRADICIONAIS
Por: Sandra Chelmicki
Um tumor de próstata é controlado com dieta. Outro, de mama, para de crescer com o uso da medicina ortomolecular. Sem cirurgia, quimioterapia ou radioterapia. Diante de casos como esses, médicos incrédulos costumam afirmar que o câncer pode se curar por si, ou que tratamentos prévios tradicionais são, de fato, os responsáveis por uma melhora atribuída a práticas não convencionais.
Até a definição de o que é medicina alternativa é questionada. Para muitos, essa separação sequer existe. "A meu ver, só existe uma medicina, uma ciência", afirma o onco-hematologista Gustavo Vilela.
No caso específico do câncer, a medicina admite conceituar os tratamentos não convencionais como terapias complementares - mas não alternativas. Uma dieta especial, por exemplo, não poderia substituir o tratamento indicado para o paciente, seja ele cirurgia, radioterapia ou quimioterapia. Para a comunidade médica, ainda faltam evidências científicas, apresentadas em estudos considerados confiáveis, que corroborem a maior parte das técnicas alternativas - portanto, é preciso mais que cautela.
A fitoterapia, que consiste na manipulação de plantas e ervas para tratar doenças, está a uma distância menor da medicina ortoxa do que outras práticas ditas alternativas. E praticamente todos os remédios têm seus princípios ativos retirados de plantas ou de outros seres vivos. Recentemente, extratos de plantas como a Curcuma longa (açafrão da terra), a Camellia sinenses (chá verde) e a Tabebuia sp (ipê ou pau d'arco), chamaram a atenção de cientistas e pacientes. Basicamente, todos têm efeitos anti-inflamatório, antioxidantes, antiproliferativos, imunoestimulantes e antimutagênicos. "Estudos indicam que a cúrcuma auxilia no manejo da leucemia mieloide crônica e do câncer de mama, mas seu impacto na imunidade ainda é incerto", admite Vilela. A Annoma muricata (graviola) e a Uncaria tomentosa (unha-de-gato) também são plantas conhecidas e com propriedades antiproliferativas e anti-inflamatórias. No entanto, a maioria das pesquisas com fitoterápicos foi realizada in vitro (em células) e em animais. Em humanos, os dados são preliminares, mas já se sabe que são substâncias seguras e bem toleradas. Os compostos botânicos são muito promissores, com evidências crescentes de que podem ajudar na prevenção e no tratamento do câncer. "Mas o uso de fitoterápicos somente deve ser feito com supervisão médica. São medicamentos, e devem ser respeitados como tal", afirma Vilela.
Connah Broom é um garoto de 13 anos que ama futebol e adora dançar. Ah, e também tem câncer. É assim que ele se apresenta no livro The Amazing Cancer Kid. Sua história é realmente extraordinária: em 2005, ele foi diagnosticado com neuroblastoma em estágio 4, um câncer raro e muito agressivo. Sua expectativa de vida era de alguns meses. Durante o tratamento quimioterápico, que não se mostrou eficaz, sua família começou uma busca por algo que pudesse aumentar as chances de o garoto sobreviver à doença. Começaram com uma mudança para uma dieta orgânica e sessões de reiki. Alguns meses depois, chegaram ao nome de uma clínica do México, em Tijuana, que utiliza a terapia fotodinâmica (PDT, na sigla em inglês para photodynamic therapy) para o tratamento do câncer. Embora a clínica nunca tivesse utilizado para neuroblastoma ou em crianças, a família de Connah decidiu encarar o tratamento.
Foram duas semanas de sessões diárias na clínica. Na volta para casa, a família dedicava cerca de três horas por dia ao tratamento. Meses depois, exames mostraram que, dos 11 tumores que existiam em 2005, restava apenas um. Mas, e se as células tumorais já tivessem sido destruídas pelos tratamentos anteriores, como a quimioterapia? O questionamento é o mesmo para muitos médicos, pois apesar de todo o conhecimento acumulado sobre o câncer, seus mecanismos ainda são misteriosos. "Alguns pacientes simplesmente se curam. Não podemos nos basear somente em casos de sucesso", afirma o especialista em cirurgia de cabeça e pescoço do Hospital Sírio Libanês de São Paulo, Orlando Parise.
"Nos casos como o de Connah, admite-se que o tratamento compassional, que busca minimizar o sofrimento causado pela doença e, ao mesmo tempo, entendê-la melhor", diz. Segundo Parise, a PDT deve ser utilizada apenas em casos selecionados e dentro de protocolos de pesquisa. "Novos remédios estão sendo estudados, na Inglaterra e na Alemanha, especialmente, para aumentar a eficácia da PDT", diz. E à medida que a medicina estiver cada vez mais alinhada à tecnologia, novas possibilidades de uso da terapia fotodinâmica podem surgir, contribuindo para a cura ou melhora dos sintomas de muitos pacientes.
MAIS SOBRE TÉCNICAS ALTERNATIVAS
ACUPUNTURA
Aplicação de agulhas em pontos que afetam diferentes órgãos e estão localizados sobre canais de energia (meridianos). Os pontos têm relação com o sistema nervoso, mas ninguém encontrou os meridianos. Eficiente contra enjoos, doenças respiratórias e problemas de pressão.
FITOTERAPIA
Manipulação de plantas para curar doenças. Prega que as plantas devem ser consumidas integralmente, e não combinadas a substâncias químicas que realçam o efeito do princípio ativo, como é nos remédios tradicionais.
HOMEOPATIA
No Brasil, é especialidade médica. Usada contra doenças crônicas (alergias, asma, rinite e enxaqueca), ainda não comprovou eficiência. A ciência ignora como age, mas reconhece alguns resultados. Pode ser o caso mais bem-sucedido de manipulação de placebo.
ORTOMOLECULAR
Emprega vitaminas, aminoácidos e minerais em quantidades maiores do que o corpo pode absorver. O diagnóstico é feito a partir de um fio de cabelo - teste sem validade científica para órgãos reguladores.
REIKI
Canalizada da energia do universo por meio de massagem para curar doenças - que seriam desequilíbrios energéticos do corpo. Sem comprovação científica.
ENTENDA A TERAPIA FOTODINÂMICA
A terapia fotodinâmica (PDT) tem sido utilizada para tratar câncer de pele. O tratamento é indicado para queratoses áctínicas (consideradas lesões pré-cancerosas), carcinomas basocelulares do tipo superficial (câncer mais frequente na população) e doença de Bowen (forma in situ do carcinoma espinocelular).
Na PDT, o paciente recebe uma medicação injetável que é ativada por estímulos luminosos, sendo absorvida com mais intensidade pelas células doentes. Por isso, a terapia é usada em lesões superficiais, acessíveis à luz - sua utilização em órgãos internos ou lesões profundas ainda é algo raro e muito complexo. Por enquanto, os estudos produziram poucas evidências, mas a terapia já mostrou eficácia no tratamento de outros tipos de câncer superficiais em estágio inicial, entre eles, tumores de cabeça, pescoço, esôfago, bexiga e pulmão. As vantagens da PDT, segundo a dermatologista Beni Grinblat, do Núcleo de Oncologia Cutânea do Hospital Albert Einstein, são o número baixo de sessões necessárias (uma ou duas) e a ausência de cicatrizes. "O tratamento, ambulatorial, também é indicado para áreas grandes com várias lesões de queratose áctínica ao mesmo tempo". No entanto, o custo é elevado, o tratamento não é totalmente indolor e o paciente não pode se expor ao sol.
DISCIPLINA E CONSCIÊNCIA
Sem cirurgia, químio e radioterapia; tumor está controlado com terapia ortomolecular
Optar por um tratamento alternativo foi algo absolutamente natural para a contadora Eveline Scheartzhaupt, de 45 anos, ao ser diagnosticada com câncer de mama. Ela tem formação e experiência em terapia floral e aromaterapia e sempre levou uma vida orientada para a saúde, além de usar habitualmente remédios homeopáticos. "Assinei um termo de responsabilidade com meu médico e parti para a medicina ortomolecular, por saber de pessoas que se curaram dessa forma", conta Eveline. O tratamento indicado pelo mastologista seria a tríade cirurgia, quimioterapia e radioterapia. Em vez disso, ela usa fórmulas fitoterápicas e homeopatia, faz sessões em aparelhos ortomoleculares, como a câmara hiperbárica, come muitos vegetais, pouca carne e nada de industrializados e açúcar. Após quase dois anos de tratamento, o tumor parou de avançar. Ela também faz acupuntura e reiki. "É uma mudança de vida. Tem que ter muita disciplina".
O PODER DA ALIMENTAÇÃO
Câncer de próstata foi tratado com dieta cigana rígida e exercícios físicos
Inconformado com os riscos de fazer uma cirurgia de próstata (incontinência urinária e impotência), Érion de Lima Benevenuti adotou uma dieta cigana como tratamento para tumor, em 2010. "Eliminei todos os alimentos precursores da doença e ingerida somente os que, comprovadamente, são anticancerígenos. E também prático atividade física seis vezes por semana". Os protocolos alimentares são baseados em pesquisas científicas de entidades como a American Association for Câncer Research. Na mesa de Érion não pode faltar arroz integral, feijão ou lentilha, tofu, germinados, vegetais crus, frutas e verduras. São vetados carnes e derivados, leite, açúcar, farinha branca e óleos. Depois de dois anos, uma nova biópsia não apresentou nenhum sinal de malignidade. Então, ele passou para a dieta preventiva, que permite a ingestão de peixe, frango sem pele e ovos. "Tive e ainda tenho medo. Mas isso também me ajuda a manter a disciplina".
DIETA GERSON: CURA OU CRENDICE?
Na visão do diretor do documentário Dying to Have Known, o americano Stephen Krosćhel, a resposta é: cura. Ele viajou por vários países para investigara eficácia da Terapia Gerson, e sua opinião fica evidente durante toda a narrativa. São apresentados diversos casos de doentes com tumores que desaparecem depois da dieta. O tratamento consiste em uma dieta especial, baseados em sucos (feitos com máquinas extratoras especiais) e alimentos orgânicos e frescos crus e cozidos, e na aplicação de enemas de café orgânico. Desenvolvido na primeira metade do século passado, sua chave estaria nos antioxidantes, compostos químicos produzidos apenas pelas plantas, que corrigem o que não funciona bem no nosso corpo.
No Brasil, o médico onco-hematologista clínico Gustavo Vivela aplicou a terapia por um período, mas diz que se desencorajou pelo fato de a dieta recomendar muito purê de batata branca e suco de laranja - ambos com carga glicêmica alta -, e proibir o consumo de diversas frutas saudáveis e o uso de fitoterápicos, chás, temperos e grãos. "É uma dieta muito difícil de ser seguida, e a maioria das pessoas desiste. Até onde eu sabia, só existe um artigo publicado mostrando que pacientes com melanoma metastático tiveram uma maior sobrevida utilizando a Terapia Gerson", diz.
Com relação ao uso do enema de café, pesquisadores britânicos que visitaram a Clínica Gerson, no México, declararam-se intrigados com os baixos escores de dor e necessidade de analgésicos dos pacientes, apesar da presença de doença metastática em muitos e do fato de que vários haviam passado por tratamentos com opioides. O comitê publicou essas observações em um artigo na revista britânica The Lancet, em 1990. Não se trata, no entanto, de uma pesquisa científica, mas de uma constatação observacional dos pacientes.
No documentário, apesar de claramente favorável à terapia, também não faltam críticas. Um dos médicos ouvidos, Dean Edell, não acredita na cura de pacientes terminais de câncer com a técnica. "Às vezes, o câncer se cura por si. Às vezes, as pessoas passaram por quimioterapia meses antes e tentaram a Terapia Gerson. Elas melhoraram e atribuem isso à terapia".
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