CONHECIMENTO CEREBRAL DESTACA MUNDO!


"EXPURGO EM MASSA!
"O presidente turco Recep Erdogan tira proveito de uma quartelada para reprimir todos os que lhe fazem oposição: jornalistas, juízes, promotores, professores e antigos aliados"


Por: Duda Teixeira

"Aproveitando-se de uma tentativa de golpe no dia 15 passado, que de tão desastrada mais pareceu uma encenação, o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan avançou como nunca antes contra todos os seus opositores, aprofundando seu projeto autocrático. Em duas semanas, demitiu 65 000 pessoas, incluindo professores universitários, funcionários do Ministério da Educação e jornalistas. Cerca de 9 000 foram presos, principalmente soldados, juízes e promotores, acusados de pertencer a uma organização terrorista ou de ser golpistas. Mais de trinta correspondentes estrangeiros perderam o registro de trabalho, e 24 emissoras de TV e rádio foram fechadas. O presidente ainda decretou estado de emergência por três meses. A medida permite realizar batidas policiais, demitir qualquer funcionário público sem justificativa e impor um toque de recolher. Um golpe adorável: era tudo o que Erdogan mais queria."


"O principal alvo do presidente é o Hizmet, um movimento islâmico liderado pelo clérigo Fetullah Gulen, que vive na Pensivânia, nos Estados Unidos, e ao qual está vinculada uma vasta rede internacional de escolas, cursos pré-vestibulares e universidades. Sua bandeira, segundo os adeptos, é promover o diálogo inter-religioso, a paz e a democracia. Gulen foi vital para a eleição de Erdogan em 2003, mas os dois romperam dez anos depois em meio a denúncias de corrupção. Desde então, Erdogan persegue todos os membros do Hizmet. Os diretores de jornais do movimento, incluindo o de maior circulação no país, o Zaman, foram demitidos, e a linha editorial virou: agora, enaltece o presidente. O governo também está expropriando as escolas do grupo e nomeando interventores, uma ação que os turcos chamam de kayyim. Escritórios da entidade foram alvo de atentados a bala. 'Tudo isso já vinha acontecendo. A mudança é que agora Erdogan está fazendo perseguições em massa', diz a antropóloga Liza Dumovich, que estuda o Hizmet e é coordenadora do Centro de Estudos e Pesquisas do Oriente Médio da Universidade Candido Mendes, no Rio de Janeiro.
Desde a tentativa de golpe militar, jovens bolsistas turcos que estudavam na Europa perderam o financiamento. 'A demissão desses expurgos é tão grande que provavelmente o governo tem escolhido suas vítimas com a ajuda do serviço nacional de inteligência', diz o indiano Mohammad Behzad Fatmi, do centro de pesquisas Turkey Institute, em Londres. Membros do Hizmet que vivem no exterior receberam no celular a seguinte mensagem: 'Que Deus amaldiçoe Fetullah e seus seguidores bastardos no Exército. Que o anjo da morte tire a vida de Fetullah'. Na Turquia e em outros países, restaurantes penduraram faixas para dizer que não aceitam integrantes do Hizmet. O governo ainda criou uma linha telefônica para que as pessoas possam denunciar a existência de membros ou simpatizantes do grupo de Gulen."


"A quartelada caiu tão bem nos planos de Erdogan de concentrar mais poder que muitos turcos passaram antecipar que ele mesmo teria planejado o golpe. Com mais de 300 mortos entre membros do governo e da população, é difícil imaginar tal maquinação. Erdogan, porém, pode ter deixado o golpe acontecer ou posto o serviço secreto para desorientar os soldados rebeldes, que agiram de maneira amadora e descoordenada. Depois de soltarem uma bomba na frente do Parlamento, os golpistas invadiram e discursaram em um canal de televisão irrelevante, com baixa audiência, e em nenhum momento chegaram perto de prender Erdogan, que se valeu de um aplicativo de celular para convocar seus apoiadores a enfrentar os tanques na rua."


A matéria acima foi retirada da revista VEJA - Edição 2 488 - Ano 49 - nº 30, págs. 68 e 69. 28 de julho de 2016. Todos os direitos autorais são reservados exclusivamente à revista VEJA e a Editora Abril.


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