CONHECIMENTO CEREBRAL DESTACA VIOLÊNCIA!
"A FACÇÃO QUE MAIS CRESCE NO MUNDO"
"Em meio a uma grande operação policial que expõe suas entranhas, o PCC faz campanha para angariar sócios, muda a estrutura de comando e lança ofensiva para dominar o crime no Brasil e avançar no exterior"
Por: Vicente Villardaga
Fernando Lavieri
"O Primeiro Comando da Capital (PCC), a mais poderosa e ameaçadora das facções criminosas do país, completa 25 anos de existência e está passando por um momento de ajustes e de expansão. Mudanças na estrutura de funcionamento depois da morte de alguns dos seus líderes pareceram ter deixado a organização mais ágil. Uma campanha nacional para ganhar novos adeptos, com desconto na taxa de adesão, tem metas de fazer a organização crescer 3% ao mês, o equivalente a mil novos comparsas. Debaixo dos olhos do Poder Público e com o quartel general instalado na Penitenciária 2, de Presidente Venceslau, em São Paulo, onde está seu principal líder, Marcos William Camacho, o Marcola, a facção alastra o terror e deixa no caminho um rastro de sangue. Seus tentáculos já alcançaram presídios de todos os estados brasileiros e envolvem criminosos de outros países da América do Sul e até da Europa.
A estratégia de desenvolvimento do PCC veio a público, nestes dias, por meio do inquérito da Operação Echelon, que interceptou telefonemas e investigou cartas trocadas entre comandantes da facção, recuperadas no esgoto da Penitenciária 2. Como resultado, a investigação da Polícia Civil e do Ministério Público levou ao indiciamento de 75 membros da organização e revelou que o PCC tem cerca de 30 mil integrantes 'batizados' em todo o País, que juram lealdade aos princípios do grupo. Revelou, também, de maneiro pormenorizada a sua estrutura de comando. Sabia-se que ele contava com um núcleo central chamado de Sintonia Geral. Descobriu-se que a esse núcleo está subordinada a Sintonia Final dos Estados e Países, nova liderança no segundo escalão, que dirige a expansão nacional e internacional da facção, e outras várias sintonias ou gerências especializadas, como a de cadastro, do livro negro e as de cada estado."
"O inquérito de 500 páginas, assinado pelo promotor Lincoln Gakiya, do núcleo de Presidente Prudente do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), traça um desenho atual do PCC. Mostra, por exemplo, que a facção recruta pessoas com próteses no corpo para entrar com celulares nos presídios e que ela tem vários agentes penitenciários nos seus quadros, como o chefe de segurança de uma prisão em Londrina, no Paraná. Expõe também uma comunicação intensa entre seus membros, para discutir negócios, assassinatos e ataques a fóruns pelo País para roubar armas - e revela que a facção se apoia forte nos meandros corruptos do sistema penitenciário para ganhar força. Conforma uma das ligações interceptadas na Operação Echelon, em que um criminoso chamado Filipe Soares, vulgo Assassino, conversa com o aliado Canela, o comando do PCC considera os presídios brasileiros lugares propícios e amigáveis para aumentar seus quadros. 'O sistema prisional é máquina de fazer PCC', diz Assassino, que comanda a facção no estado do Espírito Santo, onde 38 presídios estão sob comando do crime."
"IRMANDADE SECRETA"
"O PCC é o grupo criminoso que mais cresce no mundo atualmente', diz o promotor Márcio Sérgio Christino, que investigou a facção e é autor do livro 'Laços de Sangue - a história secreta do PCC'. 'Está avançando sobre seus concorrentes e tem amplo horizonte'. Na visão de Christino, o PCC é uma típica organização mafiosa atrás de dinheiro e poder, uma empresa do crime formada por gerentes e soldados, que já pode ser considerado um cartel internacional das drogas. Outro livro que acaba de ser lançado, 'Irmãos - uma história do PCC', do sociólogo Gabriel Feltran, mostra a facção como uma irmandade secreta, no estilo da maçonaria. 'As sintonias passam a ser o modo de organizar a facção, e cada uma delas age com total autonomia em relação às outras. O modelo de sociedade secreta é fortalecido, incorporando as estruturas empresarias e militantes', diz o autor. Com a campanha para atrair novos comparsas, chamada de 'adote um irmão', o PCC quer conquistar 30 novos integrantes por dia. Para tornar a adesão mais atraente, a organização aboliu a contribuição mensal, chamada de 'cebola', de R$ 900."
"Nos últimos tempos, várias mortes impuseram uma mudança na estrutura de poder do PCC. Em dezembro, foi morto a golpes de estilete uma de suas principais lideranças nacionais, o traficante Edilson Borges Nogueira, o Birosca, no presídio de Presidente Venceslau. Em fevereiro, caíram outros dois membros da Sintonia Geral, Rogério Jeremias, o Gegê do Mangue, e Fabiano Alves, o Paca, brutalmente assassinados em Aquiraz, no Ceará. Estes dois crimes teriam sido encomendados por Marcola. Na semana passada, um dos principais ladrões de banco e fundador da facção, Claúdio Rogério Ferreira, o Galo, 38, foi morto em São Paulo. O Audi Q3 blindado que dirigia foi atingido por 70 tiros."
"PROJETO ELEITORAL"
"Em parte, a movimentação do PCC, que também se classifica como 'partido', pode estar associada às próximas eleições. Ao mesmo tempo em que busca adesões entre os detentos, a facção quer também ter maior presença institucional fora das cadeias. O PCC tem patrocinado eventos em igrejas na periferia de São Paulo e trata de se infiltrar na política para fechar acordos que diminuiriam a repressão contra o crime em suas áreas de atuação. A facção vem fazendo candidatos desde a última eleição. O nome mais evidente é o do prefeito eleito de Embu das Artes, município da Grande São Paulo, Ney Santos (PRB), acusado pelo Ministério Público de envolvimento com o crime e de participar de uma empresa que envolvia postos de combustíveis para lavar dinheiro do tráfico. Santos teve o mandato cassado, mas se mantém no cargo por uma liminar."
"Segundo o jurista Wálter Maierovitch, estudioso do crime organizado, o PCC conta hoje com o domínio territorial, social e consegue promover a difusão do medo. 'Com isso, em tese, ele pode ter controle eleitoral e comprometer o sistema democrático', diz. 'A facção enriqueceu e a economia que nunca foi efetivamente atacada'. Segundo a polícia, o PCC fatura entre R$ 400 milhões e R$ 800 milhões por ano. Tem capacidade de sobra para investir em candidatos."
"A influência eleitoral do crime pode ser dimensionada pelo número de soldados que o seguem. 'Ao menos outros 2 milhões de homens, mulheres e adolescentes, mesmo que não batizados, são funcionários de baixo escalão dos mercados ilegais no Brasil e correm com o Comando em periferias, ruas e favelas de todo o país', diz Feltran em seu livro. Sem contar com o potencial de votos dos 726 mil presos que existem no Brasil, segundo levantamento do Ministério da Justiça. Cerca de 42% desse total, 300 mil pessoas, podem votar. São presos provisórios, ainda não condenados, que mantêm os direitos políticos.
Surgido em São Paulo, em 1993, o PCC controla hoje 90% dos presídios do estado, onde tem cerca de 11 mil associados e tenta se impor nacionalmente. Sua prioridade atual parece ser a consolidação de posições nas regiões Norte e Nordeste. O lugar mais disputado, neste momento, é o estado do Ceará, onde, na semana passada, a guerra do tráfico provocou mais de 30 ataques a ônibus, prédios públicos e bancos. A facção dominante no estado é o Comando Vermelho, mas é lá que o PCC mais cresce e conta com três mil associados. O Ceará interessa por causa de sua posição logística privilegiada que inclui os portos de Pecém e Fortaleza, canais para o tráfico internacional. A sensação diante da Operação Echelon é que muito se sabe sobre o PCC. Mas nada se faz para contê-lo. Embora nunca tenha sido tão exposta, a organização criminosa nunca esteve tão forte."
A notícia acima foi retirada da revista ISTOÉ - nº 2537, págs. 46, 47, 48, 49 e 50. 08 de agosto de 2018. Todos os direitos autorais são reservados exclusivamente à revista ISTOÉ e à Editora Três.
SUGESTÃO
Após a leitura, separamos um vídeo do programa jornalístico Brasil Urgente, que relata a intenção do PCC de dominar o crime no Nordeste. As imagens são do YouTube, e o idioma é o português.
SUGESTÃO PARA LEITURA
Livro Irmãos. Uma História do PCC (Português). Por Gabriel Feltran (Autor)
Baseado em extensa pesquisa de campo na periferia de São Paulo, este livro traz a mais original e elucidativa interpretação sobre a facção que vem desafiando o Brasil.
Em Irmãos , o sociólogo Gabriel Feltran oferece uma interpretação alternativa àquelas que vêm ocupando o debate público brasileiro e que buscam comparar o PCC com outras organizações criminosas como os comandos cariocas, as gangues prisionais americanas ou as máfias italianas, russas ou orientais. Para o autor, o modo de organização do PCC tem mais a ver com as irmandades secretas, funcionando como uma maçonaria do crime — uma rede de apoio mútuo, pautada por um conjunto de valores considerados justos, em que ninguém deve atravessar os negócios nem a honra do outro irmão.
Feltran percorre os momentos cruciais da história da facção: sua criação em Taubaté; a megarrebelião de 2001; a revolução interna de 2002, em que a visão igualitarista de Marcola ganhou força contra o projeto de terror público sob a liderança personalista de Geleião; as revoltas de 2006, que horrorizaram a classe média; as violentas disputas entre facções a partir de 2017.
Irmãos apresenta um país em que o crime conquistou efetiva hegemonia política para partes significativas da população. Nele, o PCC emerge como uma entre outras instâncias de geração de renda, de acesso à justiça ou proteção, de ordenamento social, de apoio em caso de necessidade, de pertencimento e identificação, desafiando o projeto de uma comunidade nacional integrada, promessa que que a redemocratização não logrou entregar.
Capa Comum: R$ 49,90
eBook Kindle: R$ 29,90 (app gratuitos do Amazonbr)
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