SOCIEDADE
"BEBÊ EM FASE TERMINAL FICARÁ EM LONDRES"
"Apesar de ajuda oferecida por Donald Trump e o Vaticano, motivos legais impedem a transferência de Charlie Gard"
"Justiça britânica decidiu que os tratamentos propostos não irão ajudá-lo e podem ainda causar sofrimento.
A ajuda oferecida pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e pelo Vaticano pouco mudou a situação do bebê britânico Charlie Gard, que sofre de uma doença terminal e deve ter os equipamentos que o mantêm vivo desligados, apesar da oposição de seus pais.
Mesmo com a comoção suscitada pelo caso, o bebê de 11 meses continua internado em Londres, no Reino Unido, onde a Justiça decidiu que os tratamentos propostos a Gard não irão ajudá-lo e podem ainda lhe causar sofrimento.
O bebê Charlie Gard ficou conhecido internacionalmente após Trump e o papa Francisco se ofereceram para ajudá-lo. Os pais do bebê , Chris Gard e Connie Yates, perderam sucessivas batalhas judiciais ao tentar levá-lo para um tratamento experimental nos EUA.
Na segunda (3), Trump declarou que os EUA 'ficarão felizes em ajudar' o bebê e iniciou uma campanha com hashtag CharlieGard nas redes sociais.
O Hospital Menino Jesus, que pertence ao Vaticano, também ofereceu ajuda e contatou o Grande Hospital Infantil de Ormond Street, onde Gard está internado, para saber se o bebê pode ser transferido para Roma.
A presidente do hospital italiano, Mariella Enoc, afirmou ter recebido de Londres a informação de que o bebê Charlie não pode ser transferido por motivos legais. O assunto, contudo, ainda estava sendo examinado nesta terça-feira (4).
'Eu fui contratada pela mãe, que é uma pessoa muito determinada e decidida', disse Enoc. O secretário de Estado do Vaticano, o cardeal Pietro Parolin, disse que a Santa Sé fará tudo o que pode para superar os obstáculos legais para trazer Charlie. 'Superar esses problemas? Se pudermos, faremos isso', disse Parolin.
Nesta terça, os pais do bebê passaram o tempo todo ao lado de Charlie. O menino, que nasceu no dia 4 de agosto de 2016, sofre de um raro distúrbio genético que o impossibilita de mexer os braços, as pernas ou de respirar sem auxílio de aparelhos.
A família chegou a lançar uma campanha de arrecadação de fundos para ajudar a pagar o tratamento médico nos Estados Unidos, a qual levantou E1,3 milhão (R$ 5,55 milhões) por meio de mais de 83 mil doações.
A Suprema Corte britânica decidiu, porém, que ir para os EUA e fazer o tratamento prolongaria o sofrimento do bebê sem nenhuma perspectiva realista para ajudá-lo. A corte não permitiu que o médico americano encontrado pelo casal fosse identificado nem que detalhes sobre o tratamento fossem disponibilizados.
O caso foi levado ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos, que manteve as decisões anteriores de que é do interesse do bebê que os aparelhos sejam desligados."
"CRIANÇAS AFETADAS PELA DOENÇA VIVEM POUCOS MESES"
Por: Mariana Versolato
EDITORA-ADJUNTA DE "COTIDIANO"
"Apenas 18 casos semelhantes ao de Charlie Gard foram descritos na literatura médica em todo o mundo, segundo revisão de estudos publicada em março deste ano na revista científica 'Neuropediatrics'.
E a maioria deles morreu nos primeiros meses de vida, afirmam os autores da pesquisa, do Centro Médico Infantil Schneider de Israel.
O bebê sofre da síndrome de depleção (perda) do DNA mitocondrial, causada por mutação no gene RRM2B.
Isso significa que a mutação herdada dos pais faz com que esse gene, que fica no núcleo da célula, não produza uma proteína essencial para a fabricação do DNA presente nas mitocôndrias, as usinas de energia das células.
Com a baixa quantidade de DNA e de mitocôndrias, surge a síndrome, normalmente logo após o nascimento. Ela pode atingir fígado, sistema digestório e, como no caso de Charlie, cérebro e músculos - daí que ganha a alcunha de encefalomiopática (encéfalo = dentro da cabeça; mio = músculos).
Suas consequências são fraqueza muscular, normalmente associada à insuficiência respiratória, transtornos de trânsito intestinal e problemas no sistema nervoso central, como convulsões, atraso no desenvolvimento, microcefalia e perda da audição.
A doença é 'ultrarrara e gravíssima', segundo Salmo Haskin, diretor do laboratório Genetika e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica.
'É possível manter a vida, mas o que está em discussão é a manutenção da vida com qualidade, já que o hospital alega que ela está sofrendo e que não há perspectiva de cura e de tratamento. Concordo, não há nada que pode ser feito, mas mantê-lo ou não ligado aos aparelhos está mais ligado a uma questão cultural', afirma o geneticista.
Para doenças graves e recessivas, como é o caso, há 25% de chance de um bebê ser afetado. Caso queiram ter outros filhos, os pais podem procurar aconselhamento genético e optar por tratamento de reprodução assistida em que um embrião livre da doença é selecionado e implantado."
Notícia retirada do jornal FOLHA DE S. PAULO - EDIÇÃO DIGITAL - Ano 97 - nº 32.235, pág. A13. Mundo. 05 de julho de 2017, quarta-feira (05/07/2017)
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