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"MÃE ANTES DA HORA"
"Relatório da ONU alerta para o atraso brasileiro na prevenção da gravidez de adolescentes, uma má notícia para as meninas, os bebês e até a economia do país"


Por: Monica Weinberg

"Mesmo com solavancos, a cada década o Brasil melhora um pouco nos principais termômetros que medem o patamar do desenvolvimento. Mas em um indicador específico o país patina de modo tão surpreendente e vergonhoso que ganhou destaque em um recente relatório do Fundo de População da Organização das Nações Unidas (ONU): a alta ocorrência de gravidez na adolescência. A cada cinco mulheres que engravidam no Brasil, uma não é adulta. Houve, sim, uma queda, de 700 000 para 550 000 partos por ano, em duas décadas. O problema é que a velocidade do declínio é vigorosa - 25% menos que o previsto na chamada Meta do Milênio, definida pela ONU -, o que mantém o país em pé de igualdade com vizinhos mais pobres da América Latina, descolando-se dos avanços obtidos por Argentina, Chile e Uruguai e igualando-se a Bolívia e Paraguai.
Pela primeira vez, um relatório da ONU cravou com todas as letras a consequência mais dramática da gravidez precoce: famílias enredadas no ciclo da pobreza, do qual terão menos chance de sair e de dar vida melhor à geração que chega, com horizonte estreito. Posta em cifras, a gravidez nessa etapa da vida custa ao país o equivalente a 10% do PIB - em decorrência do fato de grande parte dessas mães estar fora da escola e do mercado de trabalho e de os bebês nascerem privados dos estímulos certos. Quando crescem, as filhas tendem a repetir a história materna. 'Em nossa amostra, mais da metade das que ficam grávidas cedo tem mãe que também engravidou na adolescência', afirma a médica Albertina Duarte, do Hospital das Clínicas, em São Paulo, que há três décadas comanda um premiado programa de apoio a mães e bebês.
Em sua maioria, as meninas que chegam aos centros de atendimento coordenados por Albertina oscilam entre 15 e 17 anos, vêm de famílias de renda baixa, não planejaram a gravidez e não têm o suporte do pai do bebê. Ali elas recebem amparo no pré-natal, no parto e no tempo que vem depois, um terreno cheio de incertezas. 'Orientamos desde o básico, como trocar fraldas e amamentar, até a criação do vínculo com a criança, que muitas rejeitam no começo', diz Albertina. Aos 18 anos, há dois meses Talita Roberta Santos engravidou de um namorado de poucas semanas e vai ficar morando com a mãe. Ela externa medos que outras também têm: 'Estou terminando o ensino médio, sonhava com uma carreira, mas agora tudo mudou. Estou assustada'.
De susto em susto, do ponto de vista demográfico, ocorre no Brasil o oposto do que se viu em países mais desenvolvidos. Na Europa e nos Estados Unidos, a gravidez na adolescência baixou antes de a população em geral começar a ter menos filhos. Aqui, as famílias já têm tamanho semelhante das nações mais ricas e, no entanto, as muito jovens ainda registram seis vezes mais filhos. Entre adolescentes, as taxas de fecundidade (que trata do número de filhos, e não de grávidas) estacionou no patamar alto e inaceitável patamar de três décadas atrás. Razões econômicas e culturais, como a escassez de oportunidades e a elevação na marra à condição adulta, ajudam a esclarecer esse movimento no Brasil. Mas tem mais: a prevenção, quando há, é falha. 'Muita gente na área da saúde acha que, se o acesso a métodos contraceptivos está equacionado, o problema acabou. Só que falta orientação na hora do uso', diz a especialista Suzana Cavenaghi, coautora do recente artigo 'Fertilidade não planejada entre adolescentes da América Latina'. Vencer esse desafio é possível, com políticas adequadas, e resultará em crianças e jovens com mais chances na vida."


A matéria acima foi retirada da revista VEJA - Edição 2556 - Ano 50 - nº: 46, págs. 94 e 95. 15 de novembro de 2017. Todos os direitos autorais são reservados exclusivamente à revista VEJA e à Editora Abril.


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