PEDRO TAQUES DIZ "É ILÓGICO NÃO INVESTIGAR"
 

Na edição desta semana, 23 de setembro, o colunista Daniel Pereira da revista Veja, entrevistou o atual governador do estado de Mato Grosso, que além de trabalhar na política brasileira, também foi ex-procurador. Pedro Taques fala sobre o atual cenário do Brasil, que vai das incertezas políticas, visto os crimes que estão por ser desvendado na Operação Lava-Jato, ao processo de impeachment da atual presidente da república, Dilma Rousseff, com que a cada dia piora sua situação perante ao atual governo petista. Segundo Pedro Taques, o processo de impeachment contra à presidente é legítimo, visto que faz parte da Constituição do Brasil. A entrevista completa, você acompanha a seguir. O Conhecimento Cerebral respeita qualquer tipo de opinião e por isso, não é a favor de qualquer forma de plágio. Ainda incentivamos o apoio a qualquer veículo de comunicação que trabalhe e priorize para elaboração de informações úteis e verdadeiras.
 

Por: Daniel Pereira

"Pedro Taques tem um histórico diferente do da maioria dos políticos. Como procurador da República, desempenhou papel decisivo nas investigações de desvio de dinheiro público, a mais conhecida delas a que resultou na prisão de Jader Barbalho - com quem dividiria anos depois o Senado Federal. Ao renunciar o cargo no Ministério Público e ser eleito senador, Taques desafiou Renan Calheiros na disputa pela presidência da Casa. Sabia que perderia, mas assumiu o risco em nome da moralização de certos costumes tão caros às excelências. Como todo chefe estadual, Taques, recém-filiado ao PSDB, volta e meia está em Brasília à cata de verbas. Nada que mude seu espírito em relação àqueles que desrespeitam a Constituição e os bons costumes."
 
Daniel Pereira (Veja): "O senhor enfrentou o crime organizado quando era procurador, adotou uma postura de independência do governo quando era senador e agora dá expediente como governador. Qual dessas três tarefas é mais difícil?"
Pedro Taques: "São trincheiras diversas, mas o meu objetivo sempre foi o mesmo: defender os princípios constitucionais, como legalidade, impessoalidade, moralidade, probidade e economicidade. Vejo que há uma disfunção cultural no Brasil no sentido de (não) cumprimento desses princípios. Por exemplo: gasta-se muito e não se respeita a economicidade. Sou favorável a que o Estado cumpra atribuições em áreas básicas e imprescindíveis, como saúde, educação, segurança e, em estados com dimensões razoáveis como o nosso, transportes. O Estado tem de desenvolver bem poucas atribuições. As demais podem ser tocadas pela iniciativa privada. Como temos um Estado muito grande, há probabilidade maior de que esses princípios constitucionais sejam violados.
 
Daniel Pereira (Veja): "O senhor aplica essa filosofia na administração de Mato Grosso?"
Pedro Taques: "Claro. Cortamos o número de secretarias, de cargos comissionados e de determinados gastos, em alguns casos em até 59%, a fim de que sofrem os recursos necessários para a concretização de políticas públicas. Sou defensor da tese de que você só pode gastar o que arrecada. Não concordo com orçamento ficção. Na gestão moderna, é preciso fazer mais com menos - e em menos tempo. Para isso, você precisa de eficiência. Meus secretários assinaram um acordo de resultados pautado no meu programa de governo. Há o detalhamento de cada ação, inclusive com a origem do recurso que financiará essa ação. Se o secretário não cumprir, ele será mandado embora."
 
 
Daniel Pereira (Veja): "A situação econômica dos estados é mais complicada do que a da União?"
Pedro Taques: "A maioria dos estados tem problemas de caixa em razão da distorção no chamado pacto federativo. Na Alemanha, que é uma federação, 50% de tudo o que é arrecadado fica com os municípios. No Brasil, há uma hipertrofia de recursos da União em detrimento de estados e municípios - e essa distorção vem se agravando desde a Constituição de 1988. Mas a questão não é apenas de divisão do bolo tributário. Hoje, a União não tem responsabilidade com a segurança pública, excetuando-se o controle das fronteiras. A União também subfinancia o setor de saúde. Isso tem de ser repensado."
 
Daniel Pereira (Veja): "A balança está descompensada?"
Pedro Taques: "Os estados que fizeram seu ajuste fiscal e precisam de dinheiro novo dependem do aval da União para contratar novas operações de crédito. Isso faz com que tenhamos um pacto federativo dos estados à União. A justificativa do governo federal para a obrigatoriedade do aval é que, sem o controle da contratação de operações de crédito pelos estados, haverá prejuízo no resultado do superávit primário do setor público. Ou seja: o estado é chamado, às vezes, a pagar uma conta que não é dele. O estado não é nem pode ser submisso à União. Não é possível numa federação a presidente decidir qual será o ajuste fiscal e depois simplesmente comunicar aos governantes."
 
Daniel Pereira (Veja): "O ajuste fiscal anunciado pela presidente Dilma Rousseff é meritório?"
Pedro Taques: "Entre os principais fatores das relações econômicas estão a fidúcia, a fé, a confiança, a credibilidade, que exigem decisões corretas no momento certo. Se o governo toma decisões erráticas, muda de posições a cada instante, não tem unidade na equipe, ele inviabiliza a aceitação das medidas. Além disso, quando se enfrenta uma crise econômica como a atual, você tem de, antes de mais nada, cortar despesas, para só então ver o lado da receita. Tem de cortar o número de ministérios. O efeito fiscal é pequeno, é verdade, mas há um lado simbólico, pedagógico, importante. Tem de diminuir o número de cargos comissionados, cortar o custeio da máquina e repactuar os contratos. Não sou o dono da verdade, mas penso que você só pode falar em incremento de impostos a partir do momento em que faz o seu dever de casa. Se você não faz o dever de casa, acelera a perda de credibilidade. O governo, infelizmente, não fez o dever de casa."
 
Daniel Pereira (Veja): "O senhor acha válida a tentativa do governo de recriar a CPMF?"
Pedro Taques: "Todo dinheiro novo é bem-vindo aos estados diante da penúria em que se encontram. Os governadores hoje quase não passam de gerentes de banco -, ou gerentes de recursos humanos. A maneira como o governo colocou a questão mostra um pouco de deslealdade com os governadores: 'Eu lhe dou tanto para você convencer a bancada a aprovar a CPMF'. Eu não me sinto confortável numa situação como essa. A União precisa de dinheiro e oferece uma cenoura aos governadores. Isso é desonesto do ponto de vista político. Além disso, como disse, é preciso atacar a despesa, fazer o dever de casa. O todo não está sendo discutido. Precisamos de reformas estruturantes."
 
Daniel Pereira (Veja): "Em quatro anos como senador, o senhor apontou erros na condução da política econômica pelo governo. Recentemente, seu partido votou a favor de medidas de aumento de gastos, exatamente como fazia o PT nos tempos de oposição. O senhor concorda com essa atitude?"
Pedro Taques: "Não concordo com algumas dessas votações do PSDB. Sou um político independente e, como bom soldado, farei essa debate dentro do partido."
 
Daniel Pereira (Veja): "Alguns advogados, empresários e políticos alegam que a Operação Lava-Jato está tisnada de arbitrariedades. O senhor concorda?"
Pedro Taques: "As decisões da Lava-Jato foram feitas pelo juiz Sérgio Moro e depois mantidas pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Será que todos esses operadores do direito erraram? Não é razoável essa alegação. É natural que os advogados reclamem de arbitrariedades. Eles estão sendo pagos para isso.
 
 
Daniel Pereira (Veja): "Um esquema como o petróleo poderia funcionar sem o conhecimento do governo?"
Pedro Taques: "Eu não quero estabelecer culpa sem ter o conhecimento do processo. Seria uma deslealdade da minha parte. Mas, como disse um ministro do STF sobre o mensalão, ao julgá-lo, o esquema se desenvolveu na sala ao lado do gabinete do presidente da República. Isso começa a imbricar muito perto daquele que exerce a chefia do Poder Executivo. O petróleo está sendo investigado dentro das regras constitucionais. A Operação Lava-Jato deixará o legado de que ninguém está acima da lei e que a impunidade não persistirá."
 
Daniel Pereira (Veja): "O senhor concorda com o entendimento do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de que a presidente Dilma não pode ser investigada na Operação Lava-Jato?"
Pedro Taques: "A Constituição diz que o chefe do Poder Executivo não pode ser processado durante o exercício do mandato por atos estranhos à sua função. Ou seja: se for em razão do exercício da função, ele poderá ser processado. Como você saberá se o fato é ou não estranho ao exercício da função sem investigar? É ilógico. Investigar é uma necessidade. A Constituição não proíbe a investigação."
 

Daniel Pereira (Veja): "Um delator do petróleo disse que doou à reeleição da presidente depois de ser extorquido pelo tesoureiro da campanha. Esse fato, se confirmado, abre espaço para que Dilma seja processada?"
Pedro Taques: "Eu não vi esse depoimento. Não quero falar sobre hipóteses."
 
Daniel Pereira (Veja): "O senhor acha que já há razões para o impeachment da presidente como afirmaram integrantes do PSDB?"
Pedro Taques: "A possibilidade de impeachment está na Constituição. Ela é absolutamente legítima. Quem fala que isso é golpe está totalmente desarrazoado da Constituição e não entende o momento histórico que o Brasil vive. Eu tive um professor de direito constitucional, Michel Temer, que disse que o impeachment é um processo jurídico. Ele ensinou que às vezes há provas de que o crime foi cometido, mas não existem as condições políticas para a punição do governante. Então, o contrário também é possível (a existência de condições políticas mesmo sem a comprovação efetiva do crime). O juízo político pode ser feito independentemente da tipicidade."
 
 
Daniel Pereira (Veja): "Sendo menos tucano e mais claro, o senhor é ou não favorável ao impeachment?"
Pedro Taques: "O Tribunal de Contas da União (TCU) analisa o caso das chamadas pedaladas fiscais. No Tribunal Superior Eleitoral (TSE), está a questão do abuso de poder econômico na campanha eleitoral passada. Os deputados têm de fazer um juízo político de oportunidade e conveniência do impeachment. Os fatos hoje são muito graves e merecem, sem, uma ordem de julgamento."
 
Daniel Pereira (Veja): "A oposição cobra o governo devido ao petróleo, mas não move uma palha no Congresso a respeito de deputados e senadores acusados de participar do esquema. A indignação é seletiva?"
Pedro Taques: "O fato de o cidadão ser investigado em processo penal não tem significado, porque ele não tem uma culpa contra si estabelecida. É a chamada presunção de inocência. Agora, do ponto de vista político, a investigação tem e deve ter repercussão, sim. Eu, por exemplo, enfrentei o senador Renan Calheiros (que responde a inquéritos variados no STF) na disputa pela presidência do Senado. Então, defendo a tese de que o PSDB tem de se posicionar. O Congresso precisa superar essa dificuldade que tem para se investigar."
 
Daniel Pereira (Veja): "Qual modelo ideal de financiamento de campanha?"
Pedro Taques: "Eu recebi doações de pessoas jurídicas e físicas, mas, como senador, defendi a proibição de financiamento pela iniciativa privada. Para mim, o financiamento público poderia diminuir a possibilidade de corrupção, de venda de apoio para receber benefícios posteriores. Mas o financiamento público com lista fechada (como defendia o PT) também criaria o caciquismo e fortaleceria as cúpulas partidárias. Hoje, acredito que o importante é limitar os gastos de campanha e estabelecer mecanismos mais eficientes de fiscalização. Neste momento, a sociedade não aprovaria o financiamento público integral de campanha em razão do descrédito da classe política."
 
 
 
Daniel Pereira (Veja): "Desde a redemocratização, o Brasil adotou um modelo do presidencialismo de cooptação, no qual o governo compra - com cargos, emendas e até com dinheiro sujo - apoio parlamentar. Como é a relação do senhor com a Assembleia do seu estado?"
Pedro Taques: "Eu fui eleito com dez de 24 deputados estaduais e, mesmo assim, aprovei projetos. Nunca ofereci nada não republicano aos deputados, e nenhum deles me pediu nada não republicano. Só tenho um secretário como filiação partidária. Todos os outros são técnicos. Há no governo indicações políticas nos escalões inferiores, e a indicação política (como conceito) não pode ser criminalizada. Eu não estou fazendo faxina porque o povo que entrou comigo não está sujo, diferentemente da presidente Dilma, que recebeu um governo de continuidade. Você só faz faxina no que está sujo."
 
 
A entrevista acima foi retirada da revista Veja, edição 2 444 - ano 48 - nº 38, págs. 17, 20 e 21. 23 de setembro de 2015. Todos os direitos autorais são reservados exclusivamente à revista Veja e  a Editora Abril.
 
 

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