DOSSIÊ CÂNCER:
A PREVENÇÃO, A LUTA, A VITÓRIA

Houve um dia em que ter diabetes era uma sentença de morte - ou pelo menos de alguns membros amputados. A pressão alta, a garantia de um ataque cardíaco iminente. Ser portador de HIV, uma verdadeira arma apontada para a cabeça. Hoje, são doenças ainda graves, mas crônicas e controláveis - qualquer um pode conviver com elas e ter qualidade de vida, desde que tomados alguns cuidados.
A epidemia assustadora dos nossos tempos de vida longa e farta (inclusive de maus hábitos como fumar, beber, comer demais e não se exercitar) é o câncer e suas mais de 100 variações já identificadas. Um assunto que interessa a todos nas próximas postagens, que compreenderão um DOSSIÊ CÂNCER: A PREVENÇÃO, A LUTA, A VITÓRIAVocê lerá e verá que ter câncer não é uma loteria, mas sim uma probabilidade estatística. Esse diagnóstico vai aparecer para metade de nós nos próximos anos.
A cura definitiva da doença em qualquer estágio já foi cravada algumas vezes, e tema de notícias ou assuntos publicados neste blog. Hoje, cientistas de todo o mundo parecem convergir para uma solução menos milagrosa que um elixir mágico, e, por isso, mais plausível: manter o câncer sob controle. As últimas descobertas aplacam a fúria da multiplicação das células cancerosas e garantem uns bons anos a mais de vida, e o principal: com qualidade. Para que o câncer, muito em breve, seja a nova diabetes, metaforicamente, só nos impeça de comer alguns doces, mas não de viver.

TRATAMENTOS:
BATALHA SEM FIM - UM INIMIGO MUTANTE REQUER UMA LUTA EM VÁRIAS FRENTES. OS TRATAMENTOS MODERNOS CONTRA O CÂNCER TÊM POR OBJETIVO DOMAR COM A QUAL PRECISAREMOS CONVIVER


UM TRATAMENTO DE COMER


Por: Caue Fonseca

"Convidado a apresentar o exemplo mais espetacular de evolução de tratamento contra o câncer que já testemunhou, Rodrigo Perez Pereira, coordenador de residência médica em oncologia clínica do Hospital Santa Rita, de Porto Alegre, aponta para as tomografias de uma mulher em 2012, vítima de um melanoma com metástase nos pulmões aos 29 anos. São tantos tumores juntos que as manchas brancas na tela do computador parecem ser os próprios pulmões da paciente. 'Se mostrar essa imagem para qualquer médico, ele vai dizer que se trata de um cadáver. Pois ela viveu normalmente por dois anos. É pouco? Bom, foram dois anos levando a filhinha dela para escola todos os dias, e não acamada no hospital, com falta de ar', diz Pereira.
O principal medicamento que conteve a evolução do câncer nos pulmões dela foi o vemurafenibe, droga aprovada no Brasil em 2011 e um exemplo da medicina personalizada contra o câncer. São drogas inteligentes com agentes biológicos contra tumores pontuais. O vemurafenibe contém as mutações de uma proteína específica do melanoma, tumor para o qual não haviam sido desenvolvidos medicamentos eficientes até 2010. 
Outras drogas igualmente revolucionárias, como o trastuzumabe, que age em uma proteína na superfície de células cancerígenas - como se destruíssem os pelinhos de uma bola de tênis -, são hoje usadas contra o câncer de mama e outros em estágios mais avançados, como o de estômago. Contra este, há sob avaliação ao menos duas novas drogas de resultados preliminares promissores - cetuximab e panitumumab.


Mas nem tudo são flores. Em novembro passado, Porto Alegre sediou o I Simpósio do Centro de Prevenção e Controle de Câncer. A oncologista Alice Zelmanowicz abriu o evento agradecendo os organizadores por terem conseguido realizá-lo sem o apoio financeiro de nenhum laboratório, de modo que os efeitos dos medicamentos pudessem ser debatidos com independência.
Isso porque, se por um lado os medicamentos biológicos são hoje a grande esperança contra o câncer, por outro os efeitos colaterais a médio e longo prazo de muitos deles são desconhecidos. No simpósio, por exemplo, houve uma palestra sobre medicamentos que previnem o câncer e outra sobre medicamentos que causam câncer. Alguns medicamentos foram debatidos nas duas palestras. Ou seja: uma substância revolucionária contra determinado tumor pode fragilizar o organismo posteriormente contra outro. Afinal, uma das especialidades do câncer é a de aprender com os seus adversários biológicos. 
A proliferação de novas drogas de via oral também gerou um problema inusitado: o otimismo do próprio paciente, transformado em imprudência. Passado o susto do diagnóstico, se depois de um tempo ele está careca e tomando quimioterapia na veia, a tendência é o paciente relaxar. 'Ele se sente bem, afinal de contas o tratamento está dando resultado, então deixa de tomar os remédios de propósito. É como se ele quisesse iludir a si mesmo de que está curado', diz o oncologista Alexei Peter dos Santos, da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínicas.
Pesquisadores estimam que, iludidos pela sensação de cura, ao menos 40% dos pacientes abandonam tratamentos diários via oral ao longo de cinco anos. Para conter o fenômeno, a medicina estuda como dar alguns passos para trás: remédios em formatos injetáveis ou ministrados semanalmente, com marcação cerrada do oncologista.


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